Dinamarca torna-se primeiro país a tributar ganhos não realizados com criptomoedas
A proposta da Dinamarca de tributar ganhos não realizados em criptomoedas pode trazer um grande impacto para investidores e para a própria natureza desse mercado. Mas saliento que essa ainda é uma PROPOSTA do Conselho Tributário do país – ainda não uma lei aprovada.
Antes de tudo vamos esclarecer o que é essa “realização dos ganhos”: ela ocorre quando o investidor converte suas criptomoedas para dinheiro ou outro ativo fora do mercado cripto. Ou seja, o governo dinamarquês gostaria de taxar até o investidor que não vendeu suas criptomoedas – apenas pela valorização delas no mercado. Como esse é um negócio em que são comuns grandes oscilações de preço, tributar valorizações não realizadas parece um absurdo. O mais gritante, como salienta a reportagem, é que o imposto seria retroativo a 2009 (quando nasceu o Bitcoin). Alguém que tivesse por exemplo comprado Bitcoins há apenas 5 anos teria que pagar um ganho de capital superior a 600%. Em 10 anos, superior a 15.000%! É claro que isso é proporcional ao que eles potencialmente ganharam, mas eles precisavam ter sido avisados dessa tributação há 5 ou 10 anos atrás, para que tivessem feito as devidas reservas para pagar os impostos. A demora que os governos tiveram em se atualizar não é culpa dos contribuintes, e aplicar isso hoje retroativamente é o equivalente a uma facada nas costas!
Bem, se aprovada, essa proposta da Dinamarca seria um precedente importante para outros governos ao redor do mundo, especialmente aqueles em que o aumento da arrecadação fiscal é uma prioridade, como o Brasil. Vejam que a regulação desse mercado desafia o princípio básico da criação das criptomoedas, que seriam uma alternativa às moedas estatais, sem a regulação de governos.
Mas porque esse controle hoje é viável, se há alguns poucos anos seria impossível fiscalizar as movimentações de criptomoedas? O que mudou?
Basicamente, mudaram 3 fatores em todo o mundo:
- Primeiro, foi o avanço das tecnologias de análise de blockchains. Ferramentas sofisticadas, como as da Chainalysis e da Elliptic, utilizam inteligência artificial e algoritmos avançados para identificar padrões de movimentação e carteiras suspeitas e assim rastrear transações que podem estar ligadas a lavagem de dinheiro e ao financiamento ao terrorismo. São usadas por muitos governos;
- Em segundo lugar, foram criadas regulamentações internacionais para aumentar a transparência. Um exemplo são as diretrizes do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), que recomenda que plataformas de criptomoedas sigam o padrão Know Your Customer (conheça seu cliente) e reportem transações suspeitas. Muitos países passaram a exigir que exchanges coletem dados dos usuários e compartilhem informações com as autoridades;
- Enfim, o terceiro fator que tem facilitado o controle estatal é uma maior colaboração entre plataformas de criptomoedas e governos. Muitas exchanges passaram a adotar práticas de conformidade mais rígidas para evitar sanções e manter a confiança do mercado. Por exemplo, exchanges como Coinbase e Binance colaboram ativamente com reguladores e são periodicamente auditadas.
De qualquer forma, essa fiscalização ainda não é fácil. Existem diversas criptomoedas no mundo – na verdade são hoje mais de 22.000 tipos. Essa variedade e suas características técnicas específicas dificultam muito o controle e o rastreamento completo. Ou seja, ainda existem muitos ativos que desafiam a supervisão estatal.
Enfim, é bom considerar as repercussões dessa tributação: muitos investidores iriam naturalmente migrar para jurisdições menos reguladas, enfraquecendo a arrecadação e aumentando o risco de evasão fiscal daqueles governos que adotam a taxação. Outra: plataformas descentralizadas e não reguladas por governos (que são obviamente as preferidas dos terroristas) seriam bastante fortalecidas com a chegada desses investidores que querem “apenas entre aspas” a evasão fiscal. Seria um desafio para os órgãos de segurança em todo o mundo.
Em suma, a proposta dinamarquesa é um experimento fiscal arriscado e inédito no setor: tem potencial para redefinir a relação entre governos e o mercado cripto. Se aprovada, poderá tanto desencorajar novos investidores quanto fazer esse mercado lidar com as mesmas pressões tributárias dos ativos tradicionais. Como sempre, vamos acompanhar como as coisas evoluem e lhes trazer o que é relevante. Obrigado e até a próxima semana, pessoal.
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