A Lei nº 13.756/2018 criou e possibilitou a exploração comercial das apostas de quota fixa, conhecidas popularmente como apostas esportivas. A lei estabeleceu o prazo de dois anos, prorrogáveis por mais dois, para que houvesse a sua regulamentação. No entanto, movimentos mais intensos e concretos do Poder Executivo para definir as normas de funcionamento do setor de apostas somente começaram a ocorrer em 2023.
Um dos primeiros passos foi o envio em julho do Projeto de Lei nº 3.626/2023 ao Congresso Nacional. O PL que teve rápida tramitação e no final de dezembro foi aprovado e sancionado na Lei nº 14.790/2023 determina que as empresas interessadas em operar apostas de quota fixa deverão pagar outorga no valor máximo de R$ 30 milhões para exploração de até três marcas pelo prazo de 5 anos.
A lei também divide as apostas de quota fixa entre apostas feitas em eventos reais de temática esportiva e em jogos online, além definir legalmente o fantasy sport como o esporte eletrônico praticado em ambiente virtual a partir do desempenho de pessoas reais. As duas primeiras modalidades necessitam de autorização para exploração, enquanto a última não.
Durante a tramitação do PL, o Ministério da Fazenda avançou na regulamentação do tema e editou a Portaria MF nº 1.330/2023, cujo conteúdo discutimos de forma mais aprofundada em artigo anterior. A referida portaria surpreendeu o mercado de pagamentos ao restringir às instituições bancárias a oferta de contas para recebimento dos prêmios obtidos com as apostas.
Contudo, com a aprovação de Lei nº 14.790/2023, é provável que a Portaria MF nº 1.330/2023, que continua em vigor, sofra adaptações ao longo deste semestre para se adequar ao conteúdo da nova lei.
Ainda em relação ao setor de pagamentos, o texto da Lei 14.790 determina que os instituidores de arranjos de pagamentos, bem como instituições financeiras e de pagamento autorizadas a funcionar pelo BC, não processem transações que tenham por finalidade a efetivação de apostas em operadores de apostas não autorizados. A proibição passará a valer a partir de prazo a ser definido pelo Ministério da Fazenda.
Outra determinação da lei é que os recursos dos apostadores mantidos em contas gráficas – conta virtual mantida no sistema de apostas do operador – não devem se confundir com o patrimônio do operador, estabelecendo assim a separação patrimonial e protegendo os recursos dos apostadores de responderem por obrigações do operador, constrições judiciais em função de responsabilidades destes e de credores do operador em caso de falência, recuperação ou liquidação judicial ou extrajudicial.
Em consonância com o estabelecido na lei, a Portaria SPA/MF nº 615/2024 traz regras gerais a serem observadas nas transações de pagamento realizadas por operadores de apostas.
Entre elas, a portaria determina que os aportes e retiradas de recursos das contas gráficas dos apostadores, bem como o pagamento de prêmios, devem ser feitos, exclusivamente, através de transferência eletrônica entre contas bancárias ou de pagamentos mantidas em instituições autorizadas pelo BC. De acordo com a norma, as transações deverão ser feitas via Pix, TED, cartão de débito ou pré-pago ou transferências nos próprios livros, no caso de contas mantidas em uma mesma instituição, ficando proibida qualquer outra forma de movimentação.
O operador de apostas deve, segundo a norma do Ministério da Fazenda, implementar políticas de gerenciamento da exposição aos riscos de liquidez que prevejam processos para mensurar, monitorar e mitigar a exposição a esse tipo de risco em diferentes horizontes de tempo. Além disso, os operadores estão obrigados a constituir reserva financeira para garantir o pagamento de prêmios e demais valores aos apostadores, de no mínimo R$ 5 milhões.
O conteúdo da portaria não causou grandes surpresas ao mercado, confirmando expectativas que surgiram no início da edição de normas pelo Ministério da Fazenda, como é o caso da vedação de que instituições não autorizadas a funcionar pelo BC atuem na intermediação de transações entre o apostador e o operador de apostas. Outras expectativas também foram concretizadas, a permissão de que contas de pagamento do tipo pré-pagas mantidas em instituições autorizadas possam ser usadas para transferências de valores envolvidos em apostas, o que representa um recuo em relação ao que havia sido estabelecido na Portaria MF nº 1.330/2023.
Por fim, a última movimentação do Ministério da Fazenda para concretizar a regulamentação do setor de apostas foi a publicação, em 02 de maio, da Portaria SPA/MF nº 722 para estabelecer requisitos mínimos dos sistemas e plataformas usados na exploração de apostas e jogos online. Os sites dos operadores devem usar o domínio “bet.br” e os sistemas devem ser certificados pelas entidades certificadoras aprovadas pela Secretaria de Prêmios e Apostas. Em relação aos sistemas, é necessário que estejam localizados no Brasil, sendo permitida a sua manutenção fora do terrirório nacional apenas em países que possuem acordos de cooperação jurídica internacional com o Brasil tanto em matéria civil quanto criminal e desde que se obtenha autorização do titular dos dados para a transferência internacional, além de assegurar que a área técnica do Ministério da Fazenda tenha acesso garantido aos sistemas e dados.
Os próximos passos do Ministério da Fazenda para a regulação do setor estão divididos em 4 fases que deveriam acontecer conforme cronograma divulgado pela Portaria MF nº 561/2024. No entanto, o fim da primeira fase estava inicialmente programado para abril, com a edição de portaria que estabelece as regras, condições e procedimentos necessários à solicitação de autorização para exploração de apostas de quota fixa em todo o território nacional, o que até o momento não aconteceu.
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